Eu
tinha um fusquinha, lá pelos anos de 1982, havia chegado da Escola de Sargentos
das Armas, na cidade de Três Corações nas Minas Gerais. Eu gostava de guiá-lo
pelas ruas de Bayeux. Nesse tempo a Avenida Liberdade ainda não possuía
revestimento asfáltico, era de paralelepípedos e eu adorava passar em cima da
ponte, sim, em cima da ponte que passa sobre o Rio Sanhauá ligando a cidade
“francesa” à capital de Nossa Senhora das Neves. Elas são irmãs siamesas, pois,
mais do que separadas pelas águas do velho e principal afluente do Rio Paraíba,
estão mesmo é umbilicalmente ligadas, já que o vetusto curso d’água, chamado
pelos Índios Piragibe de Sanhauá, cuja palavra traduzida do Tupi-guarani para o
português significa Rio de Águas Claras ou Águas Limpas banha as duas cidades
co-irmãs, mas ceifaram a vida da ponte, não posso mais passar com meu automóvel
sobre ela.
Conta-nos
a história, que foi na foz deste rio que nasceu a cidade Filipéia, hoje
margeada pelo casario histórico e pelos campanários de várias igrejas, nos idos
do Século XVI, quando a cidade desabrochou em sua cabeceira, ele já corria
caudaloso ronronando: Aqui darei banho em duas meninas, acompanharei seus
crescimentos, serei pai, provedor e seus rebentos não se esquecerão nunca de
mim, notadamente quando cair em idade provecta.
Enganou-se
o velho Sanhauá, os filhos das duas comunas que ele adornou, asseou, forneceu
água para beber, ofertou o melhor dos alimentos pescados em suas águas claras,
deu de forma gratuita água para fazer suas comidas, matar a sede dos seus
animais, hoje os tratam com a mais doída de todas as ingratidões: a agressão
perversa á sua integridade física, ameaçando-o mesmo de matá-lo e de forma
impiedosa desferem rajadas de tiros, disparos mortíferos em forma de milhares
de litros de esgoto e lixo doméstico drenados e jogados nas entranhas do
santuário que a natureza nos presenteou, nas veias dessa dádiva gloriosa doada
por Deus, sem nada nos pedir e nos deu mais, como acessório que somente o
divino pode conceber, protegeu suas margens com um manto sagrado, ou seja, elas
estão cobertas pelos manguezais, berço de alimentos, habitat das mais diversas
espécies de animais, e como se Deus tivesse previsto, para não permitir que a
fonte fosse morta mais rápido do que desejam os homens, já que poucos se
atrevem a enfrentar os mangues.
Pois
bem, sobre o leito desta beleza natural, a mão de um homem conhecido como Barão
do Livramento da Província de Pernambuco, construiu no ano de 1865, pela
quantia de cento e trinta contos de réis a Ponte da Batalha, depois chamada de
Ponte da Nova Liberdade, mas calculemos, de 1865 até os dias atuais, já
decorreram exatos 148 anos, isto mesmo, um século e meio e nenhum cuidado foi
dedicado a obra d’arte de refinada engenharia e hoje ela tai dando os últimos suspiros,
na ânsia da morte e da mais aguda decepção com os que deviam protegê-la, os
filhos de Bayeux e da Parayba do Norte estão lhe assassinando, numa judiação
tamanha, que até parecem sádicos desalmados.
Socorro,
ouso clamar, ainda existe tempo, vamos todos achegar com adjutórios do Velho
Rio de Águas Limpas, vamos proibir a canalização de esgotos, o assoreamento de
suas margens e dar-lhe um presente merecido, um mimo, uma ponte parecida com
esta, uma ponte a ser edificada com a mais nobre estrutura de metal. Ele
merece, nós merecemos, esta é a ponte dos meus sonhos, não precisa que suas
estruturas sejam de ouro, mas de material superior, para deleite e orgulho dos
que habitam as duas polis, de forma que ela passe por cima da linha de trem e
morrra lá sobre a vetusta Rua Imperatriz, hoje Rua da República, fazendo-a
eclodir, resgatando a pujança da artéria sempre vocacionada para o comércio e a
indústria.
Promotor
marinho Mendes
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